segunda-feira, 3 de maio de 2010

Da saudade e do segredo.

Eles não se viam há tempo, mas aquele carinho e vontade de estar perto ainda vivia, sabiam. Coisa de amigos sem tempo.Só que aquele abraço mostrou a ela que ele não disse tudo o que tinha a dizer. Os olhos deles queriam falar de sua angústia. Mas ela fingiu não ver, nem ouvir. Na verdade, sabia ela, ele tinha segredos a contar. E ela não queria saber. Não queria porque sabia que acabaria revelando-lhe também os seus. E não poderia. Não naquela hora.
Ele a chamava de psicóloga e lhe disse que gostava de roubar comportamentos. Coisa de gente livre. Dizia ele que observava pessoas. Dizia ele que observava a si próprio, e assim sabia quem era comportamento seu e quem era comportamento roubado. Falou que a cada gesto roubado de outro ele descobria qual era seu próprio gesto. Coisa de gente que se sente à vontade dentro da própria pele. Coisa de gente que se descobre.
Ela parou, pensou. Ela nunca havia reparado em como debruçava as mãos sobre o rosto. Ele reparou. Ele tinha um jeito diferente de pousar o pé esquerdo no chão. E ela não reparou. E ela pensou em também roubar comportamentos; não para conhecer os seus, mas pra poder guardar em sua caixinha o que gostava de ver nas pessoas. Coisa de gente que sente saudade que transborda.
Ela sentiu culpa por não reparar comportamentos nele. Sentiu culpa por reparar segredos e não ouví-los gritar. Sentiu culpa por não contar a ele seu segredo. Coisa de gente que se cobra demais. Ele deu nela um antigo abraço doce e foi embora para até-qualquer-dia. Coisa de gente que sabe que o qualquer-dia não está tão longe assim.

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