terça-feira, 22 de junho de 2010

De um perceber.

Ela se sentara naquele banco enferrujado. O fim de tarde parecia trazer-lhe à memória algumas das tantas coisas que vivera ali. Era, sem equívoco, um espaço de aprendizados.
Ela aprendera que as palavras, elas precisam sair, sabe. Que, se a boca se cala, de alguma forma o resto do corpo grita. E, por tantas vezes, gritara. Gritara em gritos silenciosos, até. Aprendera que tem idéias insensatas em horas impróprias. Percebera que, em algumas vezes, era melhor calar-se.
Percebera-se percebendo. E isso já era um grito.
Era isso! Ela percebera-se percebendo. E quão belo era isto. Não mais lembrava-se de como era antes o seu modo de estar na vida. Já não sabia não ser o que agora estava sendo.
Sabia apenas que agora tem gostado de pisar descalça na grama, de sentir cheiro de chuva, de sentar-se com amigos para jogar conversas ao vento, de escrever seus rascunhos por aí. Agora.
Percebera que gosta mesmo é dessa gente que caminha pela vida com os pés descalços e sente o chão. Que pisa em caco de vidro e sangra, mas que também desliza e dança vida afora.
É que a vida acontece de infinitudes, sabe? E como, então, reduzí-la a tempo? Como, então, enclausurá-la em espaços?
Percebera que as coisas podem ter um tal(vez) sentido.
E talvez a vida seja o que se percebe agora.

4 comentários:

  1. Muito bom....gostei daqui...estou vendo as outras "fotos"!!

    []s

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  2. Poxa, Mary,
    que primor de texto!
    Me emocionou...
    Percebi-me nas tuas palavras.
    Que privilégio esse, não? Podermos nos reconhecer nas e pelas aprendizagens e "traduções" "alheias".
    Quero te agradecer por isso.

    Um bjo,

    Talita
    História da minha alma.

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  3. Convite da Talita tinha, eu, que vir na certa! A percepção de um desejo acuado ou não é a certeza de que o sentido faz-se presente. Bjs moça.

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  4. "Percebera que as coisas podem ter um tal(vez) sentido.
    E talvez a vida seja o que se percebe agora. "

    Isso é tão verdade. O que é a vida além do segundo em que se para para obervar estrelas e perceber a si mesmo? Todos os dias ela se transforma. Amanhã, talvez seja lamber um sorvete, ou perder um amigo. O importante é sentir. E ir além.

    Lindissimo!

    Beijoca, Mary

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